quinta-feira, 7 de junho de 2018

Mixtus




Mixtus
(Marcos Paulo Silva)

Desejei o fútil e o banal durante anos
Acumulei muitas coisas,
Masturbei-me na intenção de um sonho
Lá longe queria até ganhar na “megasena”
Entretido no colorido arco-íris da televisão
Letárgico, esperava por mais um episódio da vida
De uma história que não era a minha.
Assistia o mundo e vivia comigo,
Sem saber quem eu era
Esperei e esperava por um tempo que só piorava
Apatia, simpatia e fé... Nada deu certo
No olho do furacão,
Tentei refletir com meus princípios filosóficos
Quem sou eu dentro disso tudo?

Um mestiço
É uma mistura de enguiço com feitiço
Nada sabe sobre si
Pois não tem identidade
Vagueia sem passado.
Outrora... Fruto do estupro da branquitude
Agora... Projeto da indústria cultural
A identidade do mestiço é nacional:
RG, CPF, título de eleitor, carteira de trabalho
Dinheiro no banco, cartão de crédito, salário.
Time de futebol, hino nacional.
Um mestiço... Tá colado com quem?
Descolado do mundo
Um mestiço não tem passado
Ancestralidade, história ou tradição.
O mestiço. Foi forjado pelo estado nação.
Classificado racialmente por indefinição
O mestiço é alguém que não é.
Num país miscigenado,
Os descendentes de mulas são mulatos.
Os descendentes de leopardos são pardos.
Mas não são negros
Porque ser negro não lhe confere nenhum privilégio.
Todos querem ser mestiços,
Somos todos miscigenados
No país onde não se têm brancos,
Os brancos são privilegiados.

Pensando bem
Foda-se sua ideologia de democracia racial!
Não sou pardo, nem mestiço, nem mulato,
De minhas entranhas urram Zeferinas, Dandaras, Mahims, Zumbis.
Toda uma força de vida,
Toda uma contribuição cultural,
Um sonho de esperança que me mantém vivo.
Meu punho é minha lança
Símbolo da resistência
Ahh! pensando bem...
Foda-se sua ideologia de democracia racial!
Pardo e mestiço
Numa sociedade sem racismo
O mestiço é a mistura das raças
Que raça? A humana?
O mestiço é o fetiche dos brancos;
Faz a mágica de misturar
A raça humana com ela própria.
Se não existe racismo
Por que falar do mestiço como uma espécie diferenciada?
Os outros, somos nós, dizia o cara pálida.

Marcos Paulo é um dos coordenadores do Sarau do Jaca – Juventude Ativista de Cajazeiras e escreve desde 2005 sobre temas variados. O foco, no entanto, é o racismo. Com a arma nos dentes, a palavra, o poeta usa a poesia para combater o sistema opressor.

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