quinta-feira, 7 de junho de 2018

Quero falar de amor




Quero falar de amor

Sim, eu quero falar de amor
No meio de tanta dor, de um país despedaçado
onde o trabalho escravo é mais uma vez aprovado.
Eles, eles continuam pisando e chicoteando
nossos corpos massacrados.
Brancos Mascarados, Desgraçados.
Mas, mas eu vim falar de amor,
no meio de tanta dor,
da mãe chorando pelo filho que não voltou,
ou pela filha que, em casa, ensanguentada, chegou,
estuprada pelo próprio marido que a deixou...
Mas, mas eu vim falar de amor,
aquele amor que não pode ser da mesma cor,
do mesmo sexo, do mesmo calor, sabor...
e por quantas vidas ele nem sequer passou
só o silêncio ficou, parou, calou...
Ah, ah este amor...
E quantos corpos ele deixou?
Corpos Negros. Olhe o Genocídio do Povo Preto!
Corpos Negros espalhados por todo o gueto.
Corpos Negros que você chorou. E eles, choraram?
E o Estado que é laico, cujo preto, de branco, é demonizado,
onde só se tem o cabelo bonito se for alisado;
onde se tem um padrão estético forçado, implantado, empurrado,
empurrado pelos nossos ventos para que tudo ficasse miscigenado.
E os nossos? Ah, os nossos, alienados!
Brancos Mascarados, Desgraçados,
Mas, mas eu ainda eu quero um dia falar de amor!

Gisele Soares: Rainha do Ilê Aiyê 2017, professora de dança formada pelo Centro Cultural Edson Souto, agente cultural, diretora geral, coreógrafa e dançarina do conjunto de pesquisa e desenvolvimento da arte Negra Preta’nça, mentora do movimento comunitário Bazar da Deusa, Poetisa, mãe de Ayomí Zuhri.

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