quinta-feira, 7 de junho de 2018

Racista Reversa




Racista Reversa
(Vanessa Coelho)

Não uso de entre linhas 
Sem meio termos
Palavras diretas como flechas
Causando desespero.

Atravessam, 
Sem permissão ou remissão dos meus pecados
Já que desde que nascemos estamos condenados.
Sentença dada, culpada
Mas qual foi o meu erro, se a própria história já começa errada?
Escravidão, racismo institucional 
Geno(etno)cídio, abismo social.

A sua vida, burguês
Não é igual a minha
Seu discurso de meritocracia não condiz com a realidade na periferia
Tipo democracia racial
Mito que me escraviza
E na correria, quando a buzina soou a linha de chegada já tava embranquecida, entendeu?
Pouco importa se os menor tá na escola ou vendendo bala no sinal
No final, cês sempre desatina quando vê preta na graduação 
Me diz, essa preocupação:
É medo de perder a vaga das cotas fraudadas
Ou receio da competição equilibrada? 

Hipocrisia
Eu tô na espreita no meio da agonia 
Observando os "brancos de alma negra"
E sua conveniência indecente,
Antes era vitimismo
Agora cês que ser igual a gente
Mas real,
Cosplay de preto e pobre, 
Não toma baculejo de policial 
Não tem legitimidade pra o lugar de quem durante 300 anos sustenta a base da pirâmide social.

Imagina como seria, ficar na minha pele só por um dia 
Cês não aguentariam 
As gírias cês copiam
Põe silicone pra encorpar
É câmara de bronzear
Faz o seguinte... 
Fecha e fica lá até fritar
Não adianta, no meu bonde você não vai entrar.

De Osklen, desfila com favela na camisa
Suaviza a desgraça 
Mas pra nós, 
NÃO TEM GRAÇA!
NÃO TEM GRAÇA!
Problema de branco não é sangue escorrendo na vala
É febre de madruga 
Então, toma tylenol que passa.

E te prepara,
Repara a restituição 
Porque se tava barata,
Pega visão 
Assumimos o nosso legado 
E tamo causando indigestão.

Vanessa Coelho é mulher, negra, periférica, estudante de Ciências Sociais e integrante do Coletivo ZeferinaS. Define poesia marginal como re-significação do imaginário social em prol da afirmação e da preservação da identidade étnico-racial. “A poesia é a esperança dos meus saírem da base da pirâmide social a partir do resgate da nossa humanidade e do desenvolvimento da consciência crítica.”

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